Discurso de Cristovam Buarque dia
10 de junho de 2014.
COMPANHEIRAS E COMPANHEIROS BRIZOLISTAS
Hoje, é um dia em que já não cabem
propostas.
Estamos aqui para ratificar uma decisão já tomada pelo Partido desde o final de 2006, quando aceitamos trocar nossas propostas e nosso ideário por um ministério no governo recém-eleito e contra o qual vínhamos fazendo oposição desde o tempo de Brizola. Nestes quase dez anos, a decisão de continuar no governo foi mantida todos os dias. Atravessamos os escândalos no governo, inclusive no nosso ministério, sem uma crítica, uma autocrítica, nem ao menos uma análise sobre o que acontecia no País, no governo e em nosso partido. Assistimos a timidez das políticas sem oferecer propostas mais ousadas.
Estamos aqui para ratificar uma decisão já tomada pelo Partido desde o final de 2006, quando aceitamos trocar nossas propostas e nosso ideário por um ministério no governo recém-eleito e contra o qual vínhamos fazendo oposição desde o tempo de Brizola. Nestes quase dez anos, a decisão de continuar no governo foi mantida todos os dias. Atravessamos os escândalos no governo, inclusive no nosso ministério, sem uma crítica, uma autocrítica, nem ao menos uma análise sobre o que acontecia no País, no governo e em nosso partido. Assistimos a timidez das políticas sem oferecer propostas mais ousadas.
Ninguém pode negar avanços sociais
e econômicos ao longo deste período. Mas não deveríamos deixar passar os
equívocos, por omissão e por ação. Apesar de avanços no número de alunos no
ensino superior fechamos os olhos à falta de prioridade à educação de base; não
podemos deixar de elogiar programa como “mais médicos”, mas criticando o caos
na saúde pública; tínhamos obrigação de denunciar a corrupção; não podíamos nos
calar diante do desastre criado pelo aparelhamento de nossas estatais,
especialmente da Petrobrás, símbolo do progresso, do potencial e do engenho
brasileiro, criada por nosso maior líder que foi Getúlio Vargas; calamos diante
da violência nas ruas; assistimos passivamente, arrogantemente, as
manifestações do povo nas ruas.
Chegamos a 2014 com o partido
entregue ao governo. O povo está nas ruas e nós lutando por um quartinho no
fundo do palácio.
Nem ao menos dedicamos um minuto
para pensar por que o povo está nas ruas, por que seu descontentamento e o que
fazer para o Partido reencontrar sua aliança com o povo e com a história.
Para ficar no governo de hoje,
abandonamos a história.
Sobretudo, não estamos levando em conta o esgotamento do atual modelo.
As bases do rumo que o Brasil segue desde 1994 estão esgotadas, enferrujadas.
Por vinte anos baseamos nosso destino na busca do:
Sobretudo, não estamos levando em conta o esgotamento do atual modelo.
As bases do rumo que o Brasil segue desde 1994 estão esgotadas, enferrujadas.
Por vinte anos baseamos nosso destino na busca do:
- crescimento econômico
tradicional,
- do controle da inflação,
- da transferência assistencial de rendas para os mais pobres,
- da democracia parlamentar.
- do controle da inflação,
- da transferência assistencial de rendas para os mais pobres,
- da democracia parlamentar.
O crescimento tradicional se
esgotou.
É irresponsabilidade histórica continuar insistindo no rumo de uma economia baseada na exportação de bens primários e na produção de bens industriais dos anos 50 e 70. Ainda mais, para manter o governo nem tomando decisões muito arriscadas:
- gasta R$ 170 bilhões por ano de incentivos fiscais;
- aceita elevados déficits sistemáticos em conta corrente, além de déficit na balança comercial, o que não acontecia desde 2000;
- comemora o perfil de nosso produto que nada tem da economia do conhecimento que caracteriza o mundo de hoje;
- vê a economia se desindustrializando sem fortalecer um setor de criação de economia do conhecimento;
- incentiva e induz uma economia baseada no aumento do consumo à custa da necessária poupança para a construção do futuro;
- temos uma taxa de poupança interfira 13%, a menor taxa entre os países representativos da economia mundial, provocando o pequeno crescimento do nosso PIB e sacrificando o futuro;
- não consegue domar os juros, nem a inflação;
- temos uma das piores posições do mundo na classificação de competitividade;
- comemora-se sermos o sétimo PIB, já fomos o 5º, sem perceber que per capita estamos em 54ª posição e no Índice de Desenvolvimento Humano em 85º lugar, nosso PIB pode ser grande, mas é velho e mal destribuído.
- nossos preços sobem em taxas que assustam a população, com medo da carestia.
- o mercado de trabalho (bandeira historicamente ligada ao PDT): está aquecido (com taxa de desocupação em 7,1%), mas a qualidade do emprego está muito aquém do que o Brasil precisa.
É irresponsabilidade histórica continuar insistindo no rumo de uma economia baseada na exportação de bens primários e na produção de bens industriais dos anos 50 e 70. Ainda mais, para manter o governo nem tomando decisões muito arriscadas:
- gasta R$ 170 bilhões por ano de incentivos fiscais;
- aceita elevados déficits sistemáticos em conta corrente, além de déficit na balança comercial, o que não acontecia desde 2000;
- comemora o perfil de nosso produto que nada tem da economia do conhecimento que caracteriza o mundo de hoje;
- vê a economia se desindustrializando sem fortalecer um setor de criação de economia do conhecimento;
- incentiva e induz uma economia baseada no aumento do consumo à custa da necessária poupança para a construção do futuro;
- temos uma taxa de poupança interfira 13%, a menor taxa entre os países representativos da economia mundial, provocando o pequeno crescimento do nosso PIB e sacrificando o futuro;
- não consegue domar os juros, nem a inflação;
- temos uma das piores posições do mundo na classificação de competitividade;
- comemora-se sermos o sétimo PIB, já fomos o 5º, sem perceber que per capita estamos em 54ª posição e no Índice de Desenvolvimento Humano em 85º lugar, nosso PIB pode ser grande, mas é velho e mal destribuído.
- nossos preços sobem em taxas que assustam a população, com medo da carestia.
- o mercado de trabalho (bandeira historicamente ligada ao PDT): está aquecido (com taxa de desocupação em 7,1%), mas a qualidade do emprego está muito aquém do que o Brasil precisa.
Os postos de ocupação criados têm
baixo salários, implicam em altíssima rotatividade e estão em geral ligados a
atividades no setor de serviços (em geral com baixa produtividade). Além disso,
há um número muito elevado de pessoas que não procuram emprego: Estima-se que
62,6 milhões de brasileiros estão fora da força de trabalho. São pessoas na
idade de trabalhar, mas que não estão ocupadas nem procurando emprego.
A base para a manutenção da
estabilidade monetária se esgotou.
Nos últimos anos houve um relaxamento nas âncoras que mantém a estabilidade de preços. Os gastos públicos têm previsões muito preocupantes para o futuro próximo. A âncora cambial se esgota, devido ao seu impacto negativo sobre nossa competitividade internacional. Somos obrigados a elevar taxas de juros. A lei de responsabilidade fiscal vem sendo desrespeitada.
A base das transferências assistenciais está se esgotando.
Nos últimos anos houve um relaxamento nas âncoras que mantém a estabilidade de preços. Os gastos públicos têm previsões muito preocupantes para o futuro próximo. A âncora cambial se esgota, devido ao seu impacto negativo sobre nossa competitividade internacional. Somos obrigados a elevar taxas de juros. A lei de responsabilidade fiscal vem sendo desrespeitada.
A base das transferências assistenciais está se esgotando.
O programa de bolsas tem um papel
fundamental na necessária generosidade para enfrentar a pobreza extrema de
milhões de nossos compatriotas excluídos do essencial para a sobrevivência. Mas
sem a garantia de escola de qualidade ele virá um programa assistencial, não um
programa transformador social. O programa de transferência de renda completa
vinte anos desde seu início, com características educacionais, em um governo do
PT com a participação do PDT em Brasília; 15 anos desde sua expansão para todo
o Brasil. Graças ao governo Lula e Dilma a ampliação permitiu atender
praticamente todos que dela precisam. Sem esta ampliação o quadro da pobreza
teria continuado da forma assustadora e vergonha-se do passado. Mas esta base
social das últimas décadas demonstra esgotamento estrutural pela incapacidade
de oferecer uma porta de saída clara e eficiente que faça com que nenhum
brasileiro precise mais dela;
O governo não tem sido capaz, nem
demonstra compromisso em transformar os “beneficiários de bolsas” em “geradores
de renda”.
Vale lembrar, que apesar de seu
pequeno custo como proporção do PIB, apenas 0,5%, hoje 76% da receita federal
vão para gastos de transferências de renda, no lugar de investimentos para
gerar renda. E esta proporção cresce de maneira que nos próximos dez anos o
governo estará completamente esgotado em suas finanças, se esta população não
migrar da necessidade de bolsa para a geração de renda.
Nossa democracia se mostra não
apenas esgotada, mas viciada.
Esgotada pelos vícios da corrupção
generalizada em todos os setores da sociedade, muito especialmente no
comportamento político:
- com regras eleitorais atreladas
ao poder econômico e que dificultam renovação;
- sem estratégia para o longo prazo e viciado no imediatismo;
- sem uma vida partidária, sem identidades ideológica e moral;
- totalmente pragmática e desprogramática;
- com tolerância à corrupção;
- sem uma convivência estável entre os três poderes.
- sem estratégia para o longo prazo e viciado no imediatismo;
- sem uma vida partidária, sem identidades ideológica e moral;
- totalmente pragmática e desprogramática;
- com tolerância à corrupção;
- sem uma convivência estável entre os três poderes.
Em consequência, uma democracia
desacreditada e desmoralizada como o povo demonstra nas ruas. Vivemos uma
guerrilha organizada pelas redes sociais, sem lideranças, sem programas, sem
partidos; com manifestações, que unem desiludidos e desesperados, capazes de
inviabilizar o bom funcionamento da sociedade e criando um caldeirão propício
para tentativas autoritárias, vindas de quem está no poder ou de quem faz
oposição; e sem prioridades comprometidas com a transformação social, que deve
ser a obrigação de todo partido progressista como o nosso, criado sob a
liderança de Brizola.
Companheiros e companheiras, nos
últimos meses discute-se qual será o legado a ser deixado pela Copa do Mundo. É
cedo para saber se qualquer dos legados prometidos serão cumpridos:
- se os estádios serão pagos pelo setor privado;
- se haverá melhoria substancial na mobilidade social e por que esta melhoria precisava de uma Copa, uma vez que todos os recursos e decisões de investimento são nacionais;
- se haverá uma elevação da renda que compõe os gastos.
- se os estádios serão pagos pelo setor privado;
- se haverá melhoria substancial na mobilidade social e por que esta melhoria precisava de uma Copa, uma vez que todos os recursos e decisões de investimento são nacionais;
- se haverá uma elevação da renda que compõe os gastos.
Mas, desde já pode-se dizer que um
legado da Copa foi a descoberta pelo povo de que além da corrupção no
comportamento dos políticos, há também uma corrupção na definição das
prioridades, optando-se por investimentos para o presente dos ricos, sem
compromissos com as transformações estruturais, sociais, econômicas, culturais
que o País precisa para seu futuro e nossa população pobre precisa para ser
incluída definitivamente, estruturalmente, sem necessidade de transferência de
renda.
O povo descobriu que nós, os
políticos e nossos partidos não estamos sintonizados com o espírito das ruas.
Apesar disso, ruas não entraram em nossas análises para a decisão que tomaremos
nem na definição das prioridades que deveríamos levar ao governo que nos
propomos continuar apoiando.
Repito, o poder está nas ruas e nós
estamos buscando um quartinho no palácio.
Esgotamento das bases do modelo de
desenvolvimento e funcionamento da sociedade e da economia está provocando uma
implosão.
O futuro está implodindo no
vergonho estado de nossas escolas, mesmo depois de 12 anos de governo do PT e 8
de nossa participação nele. As tentativas de erradicação do analfabetismo e as
mudanças na educação de base iniciadas em 2003, inclusive com o programa Escola
Ideal para implantação de horário integral pela federalização da educação de
base, nos moldes defendidos por Brizola e Darcy, foram interrompidas a partir
de 2004. A ideia de um programa de federalização entregue ao governo em
Setembro de 2011 nunca foi nem ao menos considerada. O resultado é o aumento no
número de analfabetos em 2013 em relação a 2012.
Tudo isso por fazer a opção e definir prioridade pela ampliação do Ensino Superior. O governo Lula e Dilma com programas de cotas e o PROUNI foram capazes de ampliar substancialmente o número de alunos no ensino superior, e mudar o perfil social e racial destes alunos, mas este sucesso se esgota ao esbarrar na fragilidade dos alunos que nele entram depois de um ensino médio insuficiente.
Tudo isso por fazer a opção e definir prioridade pela ampliação do Ensino Superior. O governo Lula e Dilma com programas de cotas e o PROUNI foram capazes de ampliar substancialmente o número de alunos no ensino superior, e mudar o perfil social e racial destes alunos, mas este sucesso se esgota ao esbarrar na fragilidade dos alunos que nele entram depois de um ensino médio insuficiente.
O futuro do País está implodindo nos
limites de nossa economia sem poupança, sem capital conhecimento, com excesso
de gastos públicos, com dependência de incentivos fiscais, sem possibilidade de
reduzir os juros.
O futuro do País está implodindo na
necessidade de transferência de renda sem as quais em vez de gerar renda nossa
população se mantém na assistência e cai de volta na fome e na miséria, cada
vez que a inflação corrói o valor da bolsa.
O futuro de nosso País está
implodindo em uma democracia corrupta, corruptora, viciada no imediatismo, sem
partidos programáticos, sem políticos atentos e comprometidos com o povo, uma
democracia sob suspeição pelo povo.
Está na hora do PDT recuperar os
sonhos de sua Fundação, reler o que dizia Brizola e os demais líderes
históricos e apresentar um programa para o futuro do Brasil. A proposta
apresentada pelo PDT na campanha presidencial de 2006, sob o titulo de “A
Revolução pela Educação – Como Fazer!”, poderia ser a base para uma revisão que
permitisse ao partido ter um programa para o futuro. O ideal seria que
tivéssemos um candidato a presidente, o que propus com a tranquilidade de quem
há seis meses disse que não aceitaria ser este candidato. Mas, se não
escolhesse um candidato próprio, que ao menos cumpríssemos nossa obrigação com
o País e o nosso povo entregando aos candidatos as nossas propostas
alternativas transformadoras. A análise destes tempos vai nos acusar de termos
perdido o vigor transformador que caracterizou nossa fundação e nossa política
até recentemente.
Ouvi a algumas semanas do
presidente Lupi que é muito difícil sair de um governo depois que entramos nele
e nos acostumamos com cargos. Ele falava mais em relação aos nossos problemas
locais, onde os companheiros não aceitam sair dos governos estaduais. Mas, se é
difícil sair do governos, muitas vezes é irresponsabilidade continuar neles,
escolhendo o silêncio e o apoio cego, humilhado, subordinado e alienado.
O povo está nas ruas, não é hora de
silenciar para manter um quartinho no palácio.
Perder a sintonia com o
descontentamento das ruas, deixar de apresentar, defender e lutar pelas
reformas que o Brasil necessita, fiscal, educacional, industrial, agrícola,
política é ignorar os sonhos de Brizola; manter-se na subserviência é não
lembrar mais de Brizola; ser apenas um puxadinho de partidos no poder em troca
um ministério é romper com Brizola. Como seus herdeiros, não temos este
direito.
Sem a liderança do Lupi nos anos
seguintes à morte do Brizola, dificilmente o PDT teria sobrevivido, mas se
continuar nosso rumo conforme os últimos anos, o PDT não sobreviverá como uma
entidade política para fazer as reformas que o País precisa. Além de
conservador, será um partido apêndice. Não temos o direito de deixar que isso
aconteça.
Mas, as decisões já estão tomadas
para 2014, não adianta propor qualquer rumo no lugar do atrelamento. Resta
recuperar depois os erros do presente. Olhar para 2018 e os quatro anos que
temos até lá. Nos preparando para enfrentar o esgotamento e propor um novo rumo
para o País graças a um novo rumo para nosso PDT.
Nunca foi tão importante quanto
agora gritar bem alto “Viva Brizola” e fazermos com que este grito seja
coerente com nossas posições e lutas, não apenas um grito vazio, sem sintonia
com a realidade.
Viva Brizola, viva o PDT.
Cristovam Buarque
Cristovam Buarque
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