terça-feira, 11 de janeiro de 2011

CRISTIANISMO E SOCIALISMO

A relação CRISTIANISMO – SOCIALISMO em três pensadores distintos, Carl Marx (Trier, 1818 - Londres, 1883), Ernst Bloch ((Ludwigshafen, 1885 - Tubinga, 1977), Noubarus Gerson (Estrela do Norte, 1953 – )

É comum as pessoas viverem certas crenças e terem certas concepções de mundo como se não houvesse nada mais além; no entanto quando se deparam com visões diferentes começam a repensar e a colocar em dúvida o que antes achavam era o limite último. E muitos, de espírito livre, abraçam a novidade, outros nem tanto. Mas será através daqueles que abraçaram a novidade que o novo vai se estabelecer, e a humanidade-conhecimento darão um novo salto de qualidade.

Vamos agora abordar a relação CRISTIANISMO – SOCIALISMO, muito conflituosa e causas de discórdia e paixões acaloradas, em três pensadores distintos, Carl Marx, Ernst Bloch e Noubarus Gerson. A visão que os três apresentam desta relação por certo que não é a mesma.

Carl Marx (Trier, 1818 - Londres, 1883).

Como Marx apresentou a relação CRISTIANISMO – SOCIALISMO? Ora, fazendo leitura no Materialismo Histórico então se vê ali que a luta entre proprietários e não proprietários, na mediação do econômico, são substratos e a base de toda evolução histórico-social. Infra - estrutura, que sustenta e conduz todo o seu devir.

E que lugar ocupa o Cristianismo neste devir da História? Uma posição periférica, pertencente e sendo classificado como fenômeno da superestrutura. Como as religiões primitivas, animismo, totemismo, politeísmo, que sempre foram ligadas umbilicalmente aos poderes estabelecidos, o Cristianismo também não fugiu à regra. Mesmo que em certos momentos de sua existência conheceu independência em relação aos poderes políticos estabelecidos (quem interessou por este período de independência foi Engels; Marx passou ao largo, pois tal não ajudava na sua construção teórica), todavia logo se encaminhou para ser braço espiritual posto a serviço dos poderes estabelecidos. Ao longo de sua longa história. A tal ponto que a luta do socialismo do século XIX e XX teve pela frente também a resistência dos vários ramos do Cristianismo, todos eles tendo se colocado ao lado das forças políticas, econômicas e militares em luta contra os revolucionários marxistas.

Ernst Bloch (Ludwigshafen, 1885 -Tubinga, 1977).

Ora, se a relação CRISTIANISMO – SOCIALISMO foi vista assim por Marx, como foi por Ernst Bloch, como Marx também de família judia?

Quem foi Ernst Bloch? Tratou-se de um dos luminares da Escola de Frankfurt, quiçá o marxista que mais teve simpatia pelo Cristianismo. Como Bloch apresentou a relação CRISTIANISMO – SOCIALISMO? Já em bases inteiramente novas, ou seja: o Cristianismo foi apresentado por ele como “sonho de juventude” (*1) do socialismo.

Para Ernst Bloch o socialismo não foi outra coisa senão que no amadurecimento dos tempos históricos o Cristianismo foi fecundado de ciência. Pondo ciência no Cristianismo então temos o Socialismo; tirando do Socialismo a ciência o que resta é o Cristianismo.

Noubarus Gerson (Estrela do Norte, 1953 – )

Se a relação CRISTIANISMO – SOCIALISMO já é bem diferente em Ernst Bloch, agora se revelará avassaladoramente diferente em Noubarus Gerson.

É verdade, ele tanto rejeita a visão de Marx sobre esta relação em questão como a de Ernst Bloch. Se o Cristianismo pertence à categoria de superestrutura, como aparece em Marx, ora, uma vez que estas categorias de superestruturas são dependentes da infra-estrutura, o seu viver depende do seu viver, e esta infra-estrutura tende ao desaparecimento, isto significa dizer que o futuro do Cristianismo era desaparecer junto. Também tendo de desaparecer em Ernst Bloch, pois o socialismo não é outra coisa senão que aquele corpo se converteu neste.

Então, como é a sua relação em Noubarus Gerson? De termos complementares! O Cristianismo não é superestrutura da infra-estrutura e não é sonho de juventude do socialismo, mas é termo complementar. O Socialismo não é uma construção substantivada, como é a crença de todos, mas construção adjetivada.

O que é isso? Que a idéia de Socialismo, enquanto substantivo desenvolve-se em três sucessivos momentos, socialismo espiritual (**2), socialismo material (***3) e Socialismo (****4). Pois é, o Cristianismo é este socialismo espiritual, o socialismo é este socialismo material, e quanto ao socialismo substantivado é ainda uma construção teórica, para ser materializado na História. Quando for construído na realidade é que surgirá, então, o reino da liberdade concreta, em que cada um tem segundo as suas necessidades.

Porque ter segundo as suas necessidades só o econômico não basta; é necessária, também, certa espiritualidade, amiúde encontrada no Cristianismo. Destarte, uma sociedade em que se vive tendo segundo as suas necessidades, os impulsos de sua sustentação partem e são recebidos pelo coração, e não pelo estômago.

O MATERIALISMO HISTÓRICO (Carl Marx): Comuna Primitiva – escravatura – feudalismo – asiatismo – capitalismo – SOCIALISMOCOMUNISMO.

O ESPIRITUALISMO HISTÓRICO (W. Schmidt): Monoteísmo Primitivo – animismo – totemismo – fetichismo – politeísmo – JUDAÍSMOCRISTIANISMO. (*****5)

Em Noubarus Gerson o Materialismo Histórico deva ser visto como o “Testículo da História”. Há um processo dialético que vai construir e elaborar o espermatozóide. E quando se achar maduro será estimulado e liberado, tomando o rumo das Trompas de Falópio para ali se encontrar com o óvulo, elaborado no ovário e quando maduro então liberado, para o encontro que vai produzir e gerar a vida.

Assim, se o Materialismo Histórico é este “Testículo da História”, o Espiritualismo Histórico, por sua vez, é o “Ovário da História”. No seu ventre construíram gametas, masculino e feminino respectivamente, que um dia iriam ser unidos em um só corpo, gerando então a vida.

Se Cristianismo e Socialismo têm raiz comum, como tem raízes comum óvulo e espermatozóide (ou se entende de uma visão metafísica ou não se entende de modo algum, porque são estruturas que se encaixam, logicamente que feitas para se encaixar, todavia tendo nascimentos em corpos distintos), porque os cristãos não selaram a sua união com o Socialismo, ficando de fora, sendo atiçados e inflados para se engajarem na luta contra a sua construção?

Ora, não se engajaram na luta para a construção do Socialismo porque este chegou a eles nesta relação apresentada por Marx. E aderir à sua luta nos termos desta relação não tinha como fazer deles cidadãos de primeira classe senão cidadãos marginalizados. Não tinham garantia alguma de seu futuro no socialismo. A rigor, acreditavam que mesmo tendo contribuído para o triunfo da luta socialista, dado a natureza intrínseca do Marxismo, o passo seguinte é que os revolucionários agora os novos detentores do poder iriam cuidar em remover deles a sua fé religiosa.

Sendo termos complementares, porque os marxistas, também, não fizeram adesão ao Cristianismo? Porque o Cristianismo chegou a ele como possuindo o valor de superestrutura, e tomaram a história da Cristandade, feita de sangue, suor e lágrima – dos outros! – como prova irrefutável deste juízo condenatório.

Mas, eis que agora, no advento de Gerson, tudo vai mudar. Os muros de separação estão sendo derrubados, rente ao chão, pela ciência. Cristãos e marxistas, com uma luz na sua frente a alumiar o caminho (Isaías 42.13-17) se encaminham para a reconciliação, sim, para se reconhecer osso do mesmo osso e carne da mesma carne. Quando aqueles que circulam os seus seres na corrente sanguínea do Materialismo Histórico passar a fazê-los circular também na corrente sanguínea do Espiritualismo Histórico, tendo o mesmo juízo de valor para os fenômenos religiosos e políticos, tratando-os com isonomia intelectual; sim, quando aqueles que circulam os seus seres na corrente sanguínea do Espiritualismo Histórico passar a fazê-los circular também na corrente sanguínea do Materialismo Histórico, tendo o mesmo juízo de valor para os fenômenos políticos e religiosos, tratando-os com isonomia intelectual, então Cristianismo e Socialismo são um só na palma da mão da Humanidade, como foram um só na palma da mão da Divindade que rompeu as entranhas da transcendência e no-los deu para ajudar-nos na nossa caminhada na eternidade (E havia dois raios saindo de sua mão, e ali se escondia a sua força, Habacuque 3.4).

Deveras, Marx e Paulo, que estiveram de costas na vida de cristãos e marxistas, agora passam a estar de frente, olhando um no olho do outro, já sabendo que da sua união é que vai nascer um novo mundo, buscado e chamado pelos cristãos e marxistas de Reino de Deus e de Comunismo respectivamente (******6)

De tudo o que foi falado então se descobriu que tanto a visão de Marx como a de Ernst Bloch sobre a relação Cristianismo-Socialismo estavam fundadas na subjetividade e não tinham nenhum fundo de verdade, que agora está sendo trazida por Noubarus Gerson? Que isto nunca aconteça!

Tanto a visão de Marx como a de Ernst Bloch, bem como a trazida por Noubarus Gerson, deva ser vistas como momentos de um mesmo e único processo; que se desenvolve no plano da relatividade, não, porém, de uma relatividade subjetiva, mas, sim, de uma relatividade objetiva (*******7).

Marx

O pensamento de Marx trata-se do movimento do Absoluto adentrando a sua existência histórica enquanto ser adolescente. Fora ser infante quando a História, no seu movimento real, se achava e transitava pela sua fase teológico-espiritualista; mas agora que ela deixou para trás esta existência, que teve fim ao final da Idade Média, e entrou na nova existência antropológico-materialista, que teve início com e a partir da Renascença, ora, eis que então as condições começaram a ser preparadas para a manifestação adolescente do Absoluto.

Por ser a antítese, a verdade é que o ser adolescente se manifesta em negação ao ser infante. Ele vai negar, e re-negar, todo o seu passado infante. Contudo, este negar é condição necessária para que o ser firme e construa a sua nova identidade, que se solidificará na medida inversa da negação do seu momento anterior, bem assim como acontece com o fruto que vai se formando na razão inversa do desaparecimento da flor. Apesar desta manifestação se dar como negação, o psicologismo do ser é constituído de tal forma que ele entende como superação. Ele não está negando, que é estar construindo a outra face do mesmo fenômeno, mas está superando. Quer dizer, ele não está superando, mas negando. Mas não tem consciência da superação senão da negação. E isto é de suma necessidade, pois se tem a consciência da negação então iria entender a si mesmo como a metade de um ser que se manifesta para completar a outra metade deste mesmo ser. Mas isto não se adéqua ao processo da formação do ser, que segue o curso da lógica dialético- hegeliana da tese, antítese e síntese, as partes sendo concebida separadamente e sem consciência do processo-outra, para só então, na chegada do terceiro momento da síntese, então o sujeito reconhecer que é a soma exata dos dois momentos anteriores. Destarte, essa sensação de superação é necessária e é o que de fato irá ajudar o ser na construção desta sua nova identidade, embora adolescente nem isto reconhecer, pela qual irá se reconhecer e como tal ser reconhecido pelas manifestações que ocupam e dividem os espaços histórico-espaciais.

E outra positividade a ser destacada nessa visão de Marx sobre a relação Cristianismo – Socialismo é referente ao cumprimento da Profecia e da Escatologia. Sem essa visão de Marx não tem como se cumprir. É a condição única do seu cumprimento, como o calvário de Jesus foi condição única para o cumprimento de Isaías 53.

Profecia. Ora, encontramos no livro do profeta Isaías, capítulo 65, a descrição do aparecimento na cena histórica de uma nação paradoxal: diferente de todas as nações esta nação paradoxal não invocaria o nome de Deus, não dobraria seu joelho diante de Deus, todavia seria esta nação que traria os frutos do Reino. E no livro de Mateus, no verso 43 do capítulo 21, encontramos Jesus fazendo uso destas palavras proféticas de Isaías e se dirigindo aos sacerdotes dos seus dias e lhes dizendo que o reino de Deus lhes seria tirado e dado a uma nação que produziria seus frutos. Mais na frente, capítulo 25 verso 40 do mesmo livro de Mateus, encontramos a descrição do diálogo do Justo Juiz com este povo paradoxal, logicamente que tal se dando no desenlace escatológico, dois mil anos depois.

Bem, quem seria esta nação que segundo Isaías e Jesus produziriam os frutos do Reino? Teria sido a nação socialista? Afinal, fazendo uso do silogismo aristotélico, não obstante a sua simplicidade, todavia portador dos fundamentos da ciência que revela e propaga a Verdade, a sua dedução conduz unicamente para a nação socialista.

Esta nação é mesmo a nação socialista? Então se explica o sentido dado por Marx para a relação Cristianismo-Socialismo. Ao Marx suprimir e tornar desnecessário o Cristianismo e toda a sua gênese era neste momento que estava sendo formada e construída esta nação de que falou Isaías e Jesus. O que deixa claro a presença do Divino na gênese da formação do Marxismo. Pois quê, tanto em Isaías como em Jesus, esta nação trazia em oculto Deus ou Deus a formava em oculto (********8).

Escatologia. O cumprimento escatológico se dá em dois momentos distintos e complementares, o Dia da Ira de Javé, segundo o vaticinado pelo profeta Sofonias, e o Dia da Graça de Javé, segundo o vaticinado pelo profeta Isaías. Este Dia da Ira de Javé tem como fundamento tipológico a destruição de Judá por parte de Nabucodonozor e dos caldeus; E este Dia da Graça de Javé tem como fundamento tipológico a conquista de Babilônia por parte de Ciro e o retorno dos cativos à Judá. Ora, como a ação de Nabucodonozor e de Ciro foram partes de um único e mesmo processo, o castigo sob Nabucodonozor foi condição para que os rebeldes e renitentes de Judá passassem a dar ouvido às Palavras de Deus pelos seus profetas, ora, isto quer dizer que a ação revolucionária se daria em dois momentos distintos, mas complementares: um que reviveria as ações de Nabucodonozor contra Judá (*********9) e outro que reviveria as ações de Ciro contra Babilônia (**********10). De modo que a violência revolucionária não seria gratuita, mas necessária: a condição para que num segundo momento o conjunto dos homens pudesse aceitar a via do socialismo com alegria e não mais medo no coração.

Bem, o que seria mesmo este Dia da Ira de Javé segundo o vaticinado pelo profeta Sofonias? Este escatológico Dia da Ira de Javé seria que num preciso e determinado tempo histórico a ira divina alcançaria os sacerdotes, todos os sacerdotes, os filhos do rei, e o rei, e os príncipes, e os que usavam vestuário estrangeiro, burguesia, e os que pesavam a prata, comerciantes, e os poderosos, de modo que nem a sua prata e nem o seu ouro os iria livrar da ira de Javé. E uma vez que entendemos de forma inequívoca ser a Cristandade o antítipo de Judá, ora, para que Deus a tratasse da mesma forma que tratou Judá, com um novo Nabucodonozor, fez-se necessário o juízo negativo de Marx sobre o histórico Cristianismo. Era neste juízo negativo de Marx sobre o histórico Cristianismo e tudo que lhe diz respeito que Deus estava criando a força material com a qual iria derramar a sua ira escatológica, naqueles que pelas suas ações se tornaram merecedores.

Assim, pois, mais uma vez, temos razão de sobra para afirmar o caráter divino do Marxismo, que se até aqui não foi reconhecido, não obstante a sinalização dos profetas de Deus, que vicejaram na Teologia da Revolução e na Teologia da Libertação, em anúncios, mas também em ações, é porque o espírito que estava nos proeminentes de Judá estava também na Cristandade, nos seus sacerdotes, nos seus príncipes, nos seus reis, nos seus juízes, nos seus donos de propriedades, nos seus poderosos.

Ernst Bloch

No que diz respeito ao juízo de Ernst Bloch, já se encaminhando para a apreensão do seu númeno, da sua Verdade, o mesmo deva ser visto como já mudança no Absoluto. Em Marx ele estabeleceu a Antítese, o seu momento adolescente, e, então, com a Escola de Frankfurt, principiou ao momento terceiro da síntese. Começou, pois, todo um processo para a reconciliação, da essência do Marxismo, a sua materialidade, com a essência do Cristianismo, a sua espiritualidade. De modo que o juízo de Ernst Bloch sobre a relação Cristianismo – Socialismo já reflete este novo momento do Absoluto, de aproximação.

Noubarus Gerson

E no que diz respeito a Noubarus Gerson tudo o que concebe já é o resultado do Absoluto ter reconciliado em si os dois momentos anteriores; tê-los postos a girar em harmonia um em torno do outro, na mediação de um centro que tem nome: Jesus de Nazaré, que, por humildade e reconhecimento, do ventre teológico e do ventre antropológico como distintos e ponto de partida (do “Ovário” da História e do “Testículo” da História), divide os espaços com Che Guevara a flor mais pura elaborada no ventre antropológico da História. Paz e Graça.

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