terça-feira, 11 de janeiro de 2011

A Relação CRISTIANISMO-SOCIALISMO em Três Pensadores, Marx, Ernst Bloch e Noubarus Gerson

CRISTIANISMO E SOCIALISMO

A relação CRISTIANISMO – SOCIALISMO em três pensadores distintos, Karl Marx (Trier, 1818 - Londres, 1883), Ernst Bloch ((Ludwigshafen, 1885 - Tubinga, 1977), Noubarus Gerson (Estrela do Norte, 1953 – )

É comum as pessoas viverem certas crenças e terem certas concepções de mundo como se não houvesse nada mais além; no entanto quando se deparam com visões diferentes começam a repensar e a colocar em dúvida o que antes achavam era o limite último. E muitos, de espírito livre, abraçam a novidade, outros nem tanto. Mas será através daqueles que abraçaram a novidade que o novo vai se estabelecer, e a humanidade-conhecimento darão um novo salto de qualidade.

Vamos agora abordar a relação CRISTIANISMO – SOCIALISMO, muito conflituosa e causas de discórdia e paixões acaloradas, em três pensadores distintos, Karl Marx, Ernst Bloch e Noubarus Gerson. A visão que os três apresentam desta relação por certo que não é a mesma.

Karl Marx (Trier, 1818 - Londres, 1883).

Como Marx apresentou a relação CRISTIANISMO – SOCIALISMO? Ora, fazendo leitura no Materialismo Histórico então se vê ali que a luta entre proprietários e não proprietários, na mediação do econômico, são substratos e a base de toda evolução histórico-social. Infra - estrutura, que sustenta e conduz todo o seu devir.

E que lugar ocupa o Cristianismo neste devir da História? Uma posição periférica, pertencente e sendo classificado como fenômeno da superestrutura. Como as religiões primitivas, animismo, totemismo, politeísmo, que sempre foram ligadas umbilicalmente aos poderes estabelecidos, o Cristianismo também não fugiu à regra. Mesmo que em certos momentos de sua existência conheceu independência em relação aos poderes políticos estabelecidos (quem interessou por este período de independência foi Engels; Marx passou ao largo, pois tal não ajudava na sua construção teórica), todavia logo se encaminhou para ser braço espiritual posto a serviço dos poderes estabelecidos. Ao longo de sua longa história. A tal ponto que a luta do socialismo do século XIX e XX teve pela frente também a resistência dos vários ramos do Cristianismo, todos eles tendo se colocado ao lado das forças políticas, econômicas e militares em luta contra os revolucionários marxistas.

Ernst Bloch (Ludwigshafen, 1885 -Tubinga, 1977).

Ora, se a relação CRISTIANISMO – SOCIALISMO foi vista assim por Marx, como foi por Ernst Bloch, como Marx também de família judia?

Quem foi Ernst Bloch? Tratou-se de um dos luminares da Escola de Frankfurt, quiçá o marxista que mais teve simpatia pelo Cristianismo. Como Bloch apresentou a relação CRISTIANISMO – SOCIALISMO? Já em bases inteiramente novas, ou seja: o Cristianismo foi apresentado por ele como “sonho de juventude” (*1) do socialismo.

Para Ernst Bloch o socialismo não foi outra coisa senão que no amadurecimento dos tempos históricos o Cristianismo foi fecundado de ciência. Pondo ciência no Cristianismo então temos o Socialismo; tirando do Socialismo a ciência o que resta é o Cristianismo.

Noubarus Gerson (Estrela do Norte, 1953 – )

Se a relação CRISTIANISMO – SOCIALISMO já é bem diferente em Ernst Bloch, agora se revelará avassaladoramente diferente em Noubarus Gerson.

É verdade, ele tanto rejeita a visão de Marx sobre esta relação em questão como a de Ernst Bloch. Se o Cristianismo pertence à categoria de superestrutura, como aparece em Marx, ora, uma vez que estas categorias de superestruturas são dependentes da infra-estrutura, o seu viver depende do seu viver, e esta infra-estrutura tende ao desaparecimento, isto significa dizer que o futuro do Cristianismo era desaparecer junto. Também tendo de desaparecer em Ernst Bloch, pois o socialismo não é outra coisa senão que aquele corpo se converteu neste.

Então, como é a sua relação em Noubarus Gerson? De termos complementares! O Cristianismo não é superestrutura da infra-estrutura e não é sonho de juventude do socialismo, mas é termo complementar. O Socialismo não é uma construção substantivada, como é a crença de todos, mas construção adjetivada.

O que é isso? Que a idéia de Socialismo, enquanto substantivo desenvolve-se em três sucessivos momentos, socialismo espiritual (**2), socialismo material (***3) e Socialismo (****4). Pois é, o Cristianismo é este socialismo espiritual, o socialismo é este socialismo material, e quanto ao socialismo substantivado é ainda uma construção teórica, para ser materializado na História. Quando for construído na realidade é que surgirá, então, o reino da liberdade concreta, em que cada um tem segundo as suas necessidades.

Porque ter segundo as suas necessidades só o econômico não basta; é necessária, também, certa espiritualidade, amiúde encontrada no Cristianismo. Destarte, uma sociedade em que se vive tendo segundo as suas necessidades, os impulsos de sua sustentação partem do coração e são recebidos pelo coração, e não pelo estômago.

O MATERIALISMO HISTÓRICO (Karl Marx): Comuna Primitiva – escravatura – feudalismo – asiatismo – capitalismo – SOCIALISMOCOMUNISMO.

O ESPIRITUALISMO HISTÓRICO (W. Schmidt): Monoteísmo Primitivo – animismo – totemismo – fetichismo – politeísmo – JUDAÍSMOCRISTIANISMO. (*****5)

Em Noubarus Gerson o Materialismo Histórico deva ser visto como o “Testículo da História”. Há um processo dialético que vai construir e elaborar o espermatozóide. E quando se achar maduro será estimulado e liberado, tomando o rumo das Trompas de Falópio para ali se encontrar com o óvulo, elaborado no ovário e quando maduro então liberado, para o encontro que vai produzir e gerar a vida.

Assim, se o Materialismo Histórico é este “Testículo da História”, o Espiritualismo Histórico, por sua vez, é o “Ovário da História”. No seu ventre construíram gametas, masculino e feminino respectivamente, que um dia iriam ser unidos em um só corpo, gerando então a vida.

Se Cristianismo e Socialismo têm raiz comum, como tem raízes comum óvulo e espermatozóide (ou se entende de uma visão metafísica ou não se entende de modo algum, porque são estruturas que se encaixam, logicamente que feitas para se encaixar, todavia tendo nascimentos em corpos distintos, ocularmente sem nada que os ligue), porque os cristãos não selaram a sua união com o Socialismo, ficando de fora, sendo atiçados e inflados para se engajarem na luta contra a sua construção?

Ora, não se engajaram na luta para a construção do Socialismo porque este chegou a eles nesta relação apresentada por Marx. E aderir à sua luta nos termos desta relação não tinha como fazer deles cidadãos de primeira classe senão cidadãos marginalizados. Não tinham garantia alguma de seu futuro no socialismo. A rigor, acreditavam que mesmo tendo contribuído para o triunfo da luta socialista, dado a natureza intrínseca do Marxismo, o passo seguinte é que os revolucionários agora os novos detentores do poder iriam cuidar em remover deles a sua fé religiosa.

Sendo termos complementares, porque os marxistas, também, não fizeram adesão ao Cristianismo? Porque o Cristianismo chegou a ele como possuindo o valor de superestrutura, e tomaram a história da Cristandade, feita de sangue, suor e lágrima – dos outros! – como prova irrefutável deste juízo condenatório.

Mas, eis que agora, no advento de Gerson, tudo vai mudar. Os muros de separação estão sendo derrubados, rente ao chão, pela ciência. Cristãos e marxistas, com uma luz na sua frente a alumiar o caminho (Isaías 42.13-17) se encaminharão para a reconciliação, sim, para se reconhecer osso do mesmo osso e carne da mesma carne. Destarte, quando aqueles que circulam os seus seres na corrente sanguínea do Materialismo Histórico passar a fazê-los circular também na corrente sanguínea do Espiritualismo Histórico, tendo o mesmo juízo de valor para os fenômenos religiosos e políticos, tratando-os com isonomia intelectual, sim, quando aqueles que circulam os seus seres na corrente sanguínea do Espiritualismo Histórico passar a fazê-los circular também na corrente sanguínea do Materialismo Histórico, tendo o mesmo juízo de valor para os fenômenos políticos e religiosos, tratando-os com isonomia intelectual, então Cristianismo e Socialismo são um só na palma da mão da Humanidade, como foram um só na palma da mão da Divindade que rompeu as entranhas da transcendência e no-los deu para ajudar-nos na nossa caminhada na eternidade (E havia dois raios saindo de sua mão, e ali se escondia a sua força, Habacuque 3.4).

Deveras, Marx e Paulo, que estiveram de costas na vida de cristãos e marxistas, agora passam a estar de frente, olhando um no olho do outro, já sabendo que da sua união é que vai nascer um novo mundo, buscado e chamado pelos cristãos e marxistas de Reino de Deus e de Comunismo respectivamente (******6)

De tudo o que foi falado então se descobriu que tanto a visão de Marx como a de Ernst Bloch sobre a relação Cristianismo-Socialismo estavam fundadas na subjetividade e não tinham nenhum fundo de verdade, que agora está sendo trazida por Noubarus Gerson? Que isto nunca aconteça!

Tanto a visão de Marx como a de Ernst Bloch, bem como a trazida por Noubarus Gerson, deva ser vistas como momentos de um mesmo e único processo; que se desenvolve no plano da relatividade, não, porém, de uma relatividade subjetiva, mas, sim, de uma relatividade objetiva (*******7).

Marx

O pensamento de Marx trata-se do movimento do Absoluto adentrando a sua existência histórica enquanto ser adolescente. Fora antes ser infantil quando a História, no seu movimento real, se achava e transitava pela sua fase teológico-espiritualista; mas agora que ela deixou para trás esta existência, que teve fim ao final da Idade Média, e entrou na nova existência antropológico-materialista, que teve início com e a partir da Renascença, ora, eis que então as condições começaram a ser preparadas para a manifestação adolescente do Absoluto.

Por ser a antítese, a verdade é que o ser adolescente se manifesta em negação ao ser infante. Ele vai negar, e re-negar, todo o seu passado infante. Contudo, este negar é condição necessária para que o ser firme e construa a sua nova identidade, que se solidificará na medida inversa da negação do seu momento anterior, bem assim como acontece com o fruto que vai se formando na razão inversa do desaparecimento da flor. Apesar desta manifestação se dar como negação, o psicologismo do ser é constituído de tal forma que ele entende como superação. Ele não está negando, que é estar construindo a outra face do mesmo fenômeno, mas está superando. Quer dizer, ele não está superando, mas negando. Mas não tem consciência da superação senão da negação. E isto é de suma necessidade, pois se tem a consciência da negação então iria entender a si mesmo como a metade de um ser que se manifesta para completar a outra metade deste mesmo ser. Mas isto não se adéqua ao processo da formação do ser, que segue o curso da lógica dialético- hegeliana da tese, antítese e síntese, as partes sendo concebida separadamente e sem consciência do processo-outra, para só então, na chegada do terceiro momento da síntese, então o sujeito reconhecer que é a soma exata dos dois momentos anteriores. Destarte, essa sensação de superação é necessária e é o que de fato irá ajudar o ser na construção desta sua nova identidade, embora adolescente nem isto reconhecer, pela qual irá se reconhecer e como tal ser reconhecido pelas manifestações que ocupam e dividem os espaços histórico-espaciais.

E outra positividade a ser destacada nessa visão de Marx sobre a relação Cristianismo – Socialismo é referente ao cumprimento da Profecia e da Escatologia. Sem essa visão de Marx não têm como se cumprir. É a condição única do seu cumprimento, como o calvário de Jesus foi condição única para o cumprimento de Isaías 53.

Profecia. Ora, encontramos no livro do profeta Isaías, capítulo 65, a descrição do aparecimento na cena histórica de uma nação paradoxal: diferente de todas as nações esta nação paradoxal não invocaria o nome de Deus, não dobraria seu joelho diante de Deus, todavia seria esta nação que traria os frutos do Reino. E no livro de Mateus, no verso 43 do capítulo 21, encontramos Jesus fazendo uso destas palavras proféticas de Isaías e se dirigindo aos sacerdotes dos seus dias e lhes dizendo que o reino de Deus lhes seria tirado e dado a uma nação que produziria seus frutos. Mais na frente, capítulo 25 verso 40 do mesmo livro de Mateus, encontramos a descrição do diálogo do Justo Juiz com este povo paradoxal, logicamente que tal se dando no desenlace escatológico, dois mil anos depois.

Bem, quem seria esta nação que segundo Isaías e Jesus produziriam os frutos do Reino? Teria sido a nação socialista? Afinal, fazendo uso do silogismo aristotélico, não obstante a sua simplicidade, todavia portador dos fundamentos da ciência que revela e propaga a Verdade, a sua dedução conduz unicamente para a nação socialista.

Esta nação é mesmo a nação socialista? Então se explica o sentido dado por Marx para a relação Cristianismo-Socialismo. Ao Marx suprimir e tornar desnecessário o Cristianismo e toda a sua gênese era neste momento que estava sendo formada e construída esta nação de que falou Isaías e Jesus. O que deixa claro a presença do Divino na gênese da formação do Marxismo. Pois quê, tanto em Isaías como em Jesus, esta nação trazia em oculto Deus ou Deus a formava em oculto (********8).

Escatologia. O cumprimento escatológico se dá em dois momentos distintos e complementares, o Dia da Ira de Javé, segundo o vaticinado pelo profeta Sofonias, e o Dia da Graça de Javé, segundo o vaticinado pelo profeta Isaías. Este Dia da Ira de Javé tem como fundamento tipológico a destruição de Judá por parte de Nabucodonozor e dos caldeus; E este Dia da Graça de Javé tem como fundamento tipológico a conquista de Babilônia por parte de Ciro e o retorno dos cativos à Judá. Ora, como a ação de Nabucodonozor e de Ciro foram partes de um único e mesmo processo, o castigo sob Nabucodonozor foi condição para que os rebeldes e renitentes de Judá passassem a dar ouvido às Palavras de Deus pelos seus profetas, ora, isto quer dizer que a ação revolucionária se daria em dois momentos distintos, mas complementares: um que reviveria as ações de Nabucodonozor contra Judá (*********9) e outro que reviveria as ações de Ciro contra Babilônia (**********10). De modo que a violência revolucionária não seria gratuita, mas necessária: a condição para que num segundo momento o conjunto dos homens pudesse aceitar a via do socialismo com alegria no coração e não mais medo.

Bem, o que seria mesmo este Dia da Ira de Javé segundo o vaticinado pelo profeta Sofonias? Este escatológico Dia da Ira de Javé seria que num preciso e determinado tempo histórico a ira divina alcançaria os sacerdotes, todos os sacerdotes, os filhos do rei, e o rei, e os príncipes, e os que usavam vestuário estrangeiro, burguesia, e os que pesavam a prata, comerciantes, e os poderosos, de modo que nem a sua prata e nem o seu ouro os iria livrar da ira de Javé. E uma vez que entendemos de forma inequívoca ser a Cristandade o antítipo de Judá, ora, para que Deus a tratasse da mesma forma que tratou Judá, com um novo Nabucodonozor, fez-se necessário o juízo negativo de Marx sobre o histórico Cristianismo. Era neste juízo negativo de Marx sobre o histórico Cristianismo e tudo que lhe diz respeito que Deus estava criando a força material com a qual iria derramar a sua ira escatológica, naqueles que pelas suas ações se tornaram merecedores.

Assim, pois, mais uma vez, temos razão de sobra para afirmar o caráter divino do Marxismo, que se até aqui não foi reconhecido, não obstante a sinalização dos profetas de Deus, que vicejaram na Teologia da Revolução e na Teologia da Libertação, em anúncios, mas também em ações, como o desprendimento e doação de Camilo Torres, é porque o espírito que estava nos proeminentes de Judá estava também na Cristandade, nos seus sacerdotes, nos seus príncipes, nos seus reis, nos seus juízes, nos seus donos de propriedades, nos seus poderosos.

Ernst Bloch

No que diz respeito ao juízo de Ernst Bloch, já se encaminhando para a apreensão do seu númeno, da sua Verdade, o mesmo deva ser visto como já mudança no Absoluto. Em Marx ele estabeleceu a Antítese, o seu momento adolescente, e, então, com a Escola de Frankfurt, principiou ao momento terceiro da síntese (***********11). Começou, pois, todo um processo para a reconciliação, da essência do Marxismo, a sua materialidade, com a essência do Cristianismo, a sua espiritualidade. De modo que o juízo de Ernst Bloch sobre a relação Cristianismo – Socialismo já reflete este novo momento do Absoluto, de aproximação.

Noubarus Gerson

E no que diz respeito à Noubarus Gerson tudo o que concebe já é o resultado do Absoluto ter reconciliado em si os dois momentos anteriores; tê-los postos a girar em harmonia um em torno do outro, na mediação de um centro que tem nome: Jesus de Nazaré, que, por humildade e reconhecimento, do ventre teológico e do ventre antropológico como distintos e ponto de partida (do “Ovário” da História e do “Testículo” da História), divide os espaços com Che Guevara a flor mais pura elaborada no ventre antropológico da História (************12). Paz e Graça.


NOTAS DE RODAPÉ

(*1) O Cristianismo Como “Sonho de Juventude” do Socialismo

Ora, no trabalho foi dito que a visão de Marx e de Ernst Bloch sobre a relação do Cristianismo com o Socialismo, bem como a de Noubarus Gerson, na verdade refletem um determinado estado de espírito do Absoluto em seu movimento de retorno a si mesmo, que se encontra a si mesmo no absoluto total da História. Não são apreensões objetivas senão que subjetivas não, porém, da subjetividade finita senão que da subjetividade transcendente. Os vetores são instrumentos pelos quais revela e expressa estes seus momentos. Isso, porém, não quer dizer que a subjetividade tenha um fim em si; que todos os momentos do Absoluto são subjetivos ou relativos, como tal pode constar no manual kantiano. Não é isso. O que de fato ocorre é que o Absoluto está metido em processo, no qual cada vez mais a objetividade vai se revelando, e o que se capta dele neste momento, embora seja ele, dele, todavia não é ele na sua totalidade e completeza. Mas, quando enfim se revela em corpo inteiro então as opiniões divergentes vão perdendo posição, com a objetividade ou Verdade se impondo até atingir a inquestionabilidade. O absoluto acaba, pois, por se impor bem assim como se impõe o sol do meio-dia. Bem assim como se impôs a afirmação de que era a terra que girava em torno do sol e não o seu contrário.

No que aqui estamos tratando, ora, a apreensão exata da relação CRISTIANISMO – SOCIALISMO se deu mesmo neste terceiro momento, representado por Noubarus Gerson. É neste terceiro momento que tudo é clareado e as coisas são colocadas no seu devido lugar, nem mais nem menos. Destarte, é este o patamar onde foi assento a cadeira de juiz.

Bem, como analisar o juízo de Ernst Bloch no qual o Cristianismo apareceu como sonho de juventude do socialismo? O Cristianismo é mesmo sonho de juventude do socialismo? É uma instância de pensamento que enchida de ciência então se levantou no novo corpo do socialismo? Este esquema evolutivo de Ernst Bloch: Judaísmo – Cristianismo – Socialismo é apreensão destes fatos históricos no seu liame e no desabrochar de suas qualidades intimamente ligadas e mutuamente pertencentes? Sendo a fonte do Cristianismo, Jesus teria sido a adolescência de Marx, ao passo que Moisés a sua infância?

Ora, que o socialismo teve um sonho de juventude isto é fora de dúvida, mas devemos encontrá-lo no socialismo utópico e não no Cristianismo!

Assim, o esquema correto seria este: Materialismo Inglês, Infância do Socialismo; Materialismo Francês, Adolescência do Socialismo; e Materialismo Alemão, que foi a idéia de socialismo que, enfim, se revelou na sua forma de ciência. Então este deva ser o esquema verdadeiro: Adam Smith – Proudhon – Marx.

E o Cristianismo não pode ser uma instância de pensamento contada como juventude do socialismo porque a sua essencialidade é contada como espiritual e a sua conceituação é catalogada como pertencente ao campo restrito da religião. Embora o seu campo de interlocução fosse universal, todavia o cristianismo nasceu como religião. Foi religião no seu nascimento; de modo que a sua essência e seu valor só podem ser comparados, medidos e acareados com outras religiões. O que implica dizer que o socialismo tem de ser medido e comparado com sistemas afins. É nesta acareação com sistemas afins que se pode descobrir o seu real valor. O que, convenhamos, tal tem sido feito pela filosofia celestial que buscou a gênese do Marxismo, não em sistemas religiosos, mas no materialismo inglês, e, passando pela transitoriedade dos socialismos utópicos, então chegou à sua forma de ciência, no caso o Socialismo Científico que, por ser ciência, realmente deslanchou a luta por igualdade na terra.

Mas, é certo que Ernst Bloch não desconhecia o afirmado; se vivo com certeza reagiria: não vejo nisto nenhuma novidade!

Não, mas Ernst Bloch estava preocupado e empenhado em descobrir a verdadeira relação do Cristianismo com o Marxismo. Como um verdadeiro revolucionário não estava contente com a forma como Marx tratou o assunto, e intuía que isto iria se revelar desastroso para a revolução, pois as massas, trazendo impresso em suas almas a religião, quando não mais tivesse fome de pão, por certo que iria abandonar o Marxismo e a Revolução só podendo voltar para o antigo vômito. De modo que refletindo já o pensar novo da Escola de Frankfurt buscou estabelecer a ligação do Cristianismo com o Socialismo em bases que não a estabelecida por Marx e por epígonos. Via o Cristianismo manietado e sufocado no Marxismo. Pelo seu passado e essência achou que merecia lugar melhor. E acabou por colocar o Cristianismo em posição melhor, sonho de juventude do socialismo.

É verdade, dentre as inúmeras variedades do Cristianismo, pedríneo, paulíneo, tiaguista, joanista, sobrou uma essencialidade que abaliza todo o trabalho de Ernst Bloch. A caridade cristã que é seu corpo universal e comum a todas as suas ramificações. E neste momento se revela a magnanimidade da apreensão de Ernst Bloch.

De fato, a caridade cristã, a preocupação e ação do Cristianismo no campo sócio-material (econômico), é, deveras, sonho de juventude do Socialismo. O que quer dizer que todo cristão, todo verdadeiro cristão, tende para o socialismo, pois o carrega em germe, em potência. E se for desenvolvido nele a ciência fatalmente se levantará em novo corpo, nova existência, defenestrando a caridade e passando a lutar para que as pessoas sejam libertas e não fiquem à mercê de caridade. E isto se daria através de uma leitura científica da sociedade, descobrindo então o que motiva a caridade é um sistema baseado em leis que faz com que grandes contingentes da sociedade sejam conservados na miséria. E esta descoberta leva a que se lute pela superação deste sistema, instaurando no seu lugar um novo sistema, que trabalha a libertação de todos os segmentos da sociedade, com prioridade para o segmento então marginalizado.

Mas, convenhamos, a caridade cristã não é todo o corpo do Cristianismo e nem mesmo a sua parte mais importante. É acidente e não essência. O que é de fato essência no Cristianismo?

A essência do Cristianismo nos remete ao campo espiritual. O Cristianismo era a ciência que acabava de se manifestar neste campo. Confrontando e se medindo com as religiões existentes, pelo seu valor, pela sua qualidade, o Cristianismo era simplesmente o nascimento da ciência. Trazia as respostas certas para as necessidades e inquietações das pessoas. As pessoas sofriam e buscavam nas religiões respostas ao seu sofrimento; mas o Cristianismo, portando o amor, então mostrou que a causa do seu sofrimento estava nelas mesmas. Tinham de passar por novo nascimento, experimentar o amor de Deus que ele enviava na mediação única de Jesus. E as religiões tornaram-se desnecessárias, com o Cristianismo explodindo por todo o império, não por imposição, mas porque as pessoas tiveram a oportunidade de experimentá-lo; e pela experiência puderam ver a sua grande diferença com as religiões então existentes.

Ora, se buscamos a essencialidade do socialismo na sua luta material contra o capitalismo, a essencialidade do cristianismo é encontrada na sua luta contra o paganismo. E esta essencialidade não é de modo algum sonho de juventude do socialismo, mas complemento do socialismo, que por sua vez é complemento do Cristianismo (ver I Coríntios 13.9-10).

Para concluir, a relação científica entre Cristianismo e Socialismo deva ser esta: o Cristianismo foi a Primavera da História, conquanto o Judaísmo o seu Inverno. De modo que o Cristianismo não foi outra coisa senão que na plenitude dos tempos espirituais o botão do Judaísmo se abriu na mais linda e na mais pura das flores, que veio à existência à custa do sangue de muitos mártires.

Mas, primavera e flores não têm um fim em si mesmo, são momentos de um processo maior. De fato, chega o momento em que as flores começam a fenecer, e a murchar, até que morrem. E nos seus lugares começa a nascer o fruto. Mas, quem murcha e morre são as pétalas da flor. A sua essência íntima, o seu néctar, se passa para o fruto em nascimento; e vai se ocultar nos seus recônditos. E no tempo certo, na chegada do Outono, então este néctar é despertado e começa a fermentar e a se espalhar pelo fruto, amolecendo-o e o tornando adocicado e saboroso.

Pois é, esta é a relação científica do Cristianismo com o Socialismo: o Socialismo procede do Cristianismo assim como o fruto procede da flor. E não foi por acaso que tudo começou com um judeu protestante, Karl Marx, que na medida em que foi teorizando o Socialismo mais e mais foi se desvencilhando e se afastando da religião e de tudo que lhe dizia respeito. Mas, o que morria em Marx eram as pétalas da religião, que quer dizer as suas fantasticidades, a sua beleza ímpar, mas o seu néctar, que é o amor ao próximo, se passava para o fruto do socialismo em nascimento, sendo o verdadeiro alicerce sobre o qual Marx teorizava. De modo que o socialismo quando nascia, não obstante a sua imperceptibilidade, já trazia em oculto, nos seus recônditos, este néctar que nasceu com a religião cristã. De modo que quando chegasse o seu tempo, o outono da Revolução-Marxismo, que é o outro lado da primavera da Igreja-Cristianismo, então este néctar iria se desenvolver no interior do socialismo, amolecendo a sua carne dura e expurgando para fora todo o seu amargor, adocicado e saboroso, então se transformando em alimento de todos, para todos. E este Outono do Marxismo-Revolução, que palpitava no coração de Che Guevara ansiando o seu nascimento, se aproxima o seu nascimento agora no advento da filosofia celestial, que é o socialismo plenamente maduro, de todos, para todos, todavia tendo chegado a tal depois de passar pelo estágio de vez da Escola de Frankfurt.

(2) Socialismo Espiritual

No corpo do escrito o conceito de socialismo foi apresentado como o mesmo sendo formado e constituído de três partes, que é seu corpo único, uno, indivisível, pois é assim que ele se achava na sua realidade primeira e mais profunda, no plano espiritual. E que partes eram estas? O Socialismo Espiritual, o Socialismo Material e o SOCIALISMO, que é na verdade um Universal sustentando e dando vida a estas suas duas adjetivações, sim, elas girando em torno deste centro e ligadas a ele, produzindo vida de forma ininterrupta.

E o que é mesmo o Socialismo Espiritual? Trata-se de uma manifestação voltada para as questões espirituais da sociedade e para os seus indivíduos, procurando estabelecer a igualdade de relacionamento entre todos. Nesta sociedade é ensinada aos indivíduos a não extrair mais-valia espiritual, que é explorar e profanar o corpo, pois o mesmo é sagrado, é templo do Espírito Santo. Numa sociedade assim a união são estáveis, pois os elementos que produzem desagregação nos lares não estão presentes. A extração da mais-valia espiritual é abominável.

O Socialismo Espiritual se manifestou após longo tempo sendo gestado no coração da História. A sua manifestação se deu com o advento do Cristianismo, mas é possível se observar alguns traços seus nas religiões que o antecedeu, em especial no Judaísmo.

Para facilitar a sua compreensão tomemos um exemplo moderno que em muito ajudará na sua compreensão.

No ano de 1906 explodiu em Los Angeles um movimento religioso que ganhou o mundo e hoje se conta em toda a terra o número dos seus seguidores em cerca de quatrocentos milhões. Estamos falando do moderno movimento pentecostal que por todos os ângulos de análise é renascimento do movimento dos primeiros cristãos, daqueles que começaram a se formar após Paulo Apóstolo.

O que foi este movimento? Este movimento nasceu em um templo construído pelos metodistas para ser novo lugar de culto, mas que nunca veio a ser. Se achando abandonado então um grupo nascente de pentecostais o transformou em lugar de culto. Como eram portadores da novidade do falar em línguas estranhas, e de amor entre todos seus freqüentadores, logo as boas novas se espalhou de modo que de toda a Los Angeles e entorno vinham aos milhares para aquele lugar. E ali, na presença e mediação de um homem simples do povo, William Joseph Seymour, filho de ex-escravos, negros e brancos, ricos e pobres, trabalhadores e patrões, asiáticos e mexicanos, lavadeiras negras e patroas brancas se abraçavam e se reconheciam como irmãos.

Mas, convenhamos, esta igualdade espiritual entre eles se dava em uma sociedade em que o sistema político-econômico era baseado na desigualdade, e isto refletia em suas vidas, não raro de forma amarga, pois não raro a forma material acabava se impondo nas escolhas e decisões. O fel amargo desta anfibialidade foi também provado por muitos luminares do protestantismo, que passaram a viver a igualdade espiritual de Jesus, mas em um mundo dominado pela desigualdade e competição materiais. Ainda hoje esse antagonismo põe muitos corações em sofrimento e é responsável pela quase totalidade dos cristãos que se desviam da igualdade espiritual de Jesus. A desigualdade material e todos os seus frutos acabam interferindo e corrompendo esses corações.

(3) Socialismo Material

O Socialismo Material não é negação do socialismo espiritual, pois quê pertence à outra ordem de fenômeno. Ele diz respeito às questões materiais.

No socialismo material a extração da mais-valia material não existe. O que nele é sagrado são o corpo e o trabalho do trabalhador. Ninguém tem o direito de explorá-lo e de se locupletar com o seu suor.

Uma sociedade que vive sob o regime do socialismo material não tem falta de bens materiais, pois tudo o que é produzido é para a divisão e uso de todos. Se problemas climáticos reduzem a colheita então o pouco que se tem é repartido de forma equânime entre todos.

Mas, as dificuldades apontadas para quem vive o socialismo espiritual numa sociedade dominada pelas desigualdades materiais, ora, de forma inversa, tal ocorre com quem vive no socialismo material. Como o socialismo material está desligado do socialismo espiritual, pois foi concebido na tríade hegeliana da tese e antítese, por falta desta espiritualidade, as pessoas não raro são tentadas a criar para si privilégios. Em especial os que ocupam postos no aparelho de Estado. E a falta da espiritualidade cristã no socialismo material vai pouco a pouco corroendo o caráter e fazendo com que muitos se desinteressem dele, como no lado oposto a falta do socialismo material corrói caráter fazendo com que muitos se desinteressem do socialismo espiritual.

(4) SOCIALISMO

Ora, a partir do que foi exposto, o socialismo enquanto substantivo só pode ser entendido como sendo a união em corpo único do socialismo espiritual com o socialismo material. Estiveram apartados, sem qualquer comunicação entre si, mas agora são reconciliados e unificados em corpo único, se justapondo, de modo um ajudar e sustentar o outro.

Este estágio, por um lado, é aquilo que marxistas chamam de Comunismo, e, por outro, o que cristãos chamam de Reino de Deus. Não foi assim visto jamais por marxistas e cristãos, é certo, mas estas são as suas únicas engrenagens. Se for entendido por Comunismo e Reino de Deus como sistemas sociais em estado de perfeição, as suas engrenagens únicas são estas: os marxistas construirão o Comunismo quando se deixarem fecundar pela espiritualidade cristã; e os cristãos construirão o Reino de Deus quando se deixarem fecundar pela materialidade socialista.

É então o reino perfeito, cujo arquétipo se acha remotamente no livro de Êxodo (Êxodo 16.14-21), no episódio em que Deus mandou do céu o alimento do maná. E cada qual o apanhava segundo o número de pessoas em sua tenda, não podendo apanhar além do que tinha necessidade.

E nunca é demais lançar mão de exemplos simples a fim de ser compreendido tudo que está sendo exposto e se procura compreensão para tal. Foi falado sobre o nascente movimento pentecostal em Los Angeles, naquele ano de 1906, e foi falado de como ali pessoas vinham de todos os lugares e não importa a sua condição social ou de raça se abraçavam e se entendiam como irmãos.

Mas, suponhamos que no socialismo espiritual um jovem pobre se apaixone por uma moça rica. Haveria o casamento? Já houve situações assim em que a questão da desigualdade social não interferiu prevalecendo o caráter como riqueza maior, mas houve situações em que a questão da desigualdade social interferiu sim. E como ficou aqueles corações, em especial o do moço pobre? Pois é, no SOCIALISMO substantivado, que tanto pode ser chamado de Comunismo como de Reino de Deus tal não acontecerá. Porque todos são socialmente iguais. Iguais tanto no plano espiritual como no plano material.

Então, podemos dizer que este estágio, da união do Cristianismo com o Socialismo, mais precisamente que da união de Paulo com Marx (porque muitos já falaram nesta união se atendo a muitos aspectos do cristianismo, em geral econômicos, mas quanto a Paulo passaram ao largo o que explica terem excluído do seu projeto este fabuloso contingente dos evangélicos pentecostais) a sua construção na sociedade não resta a menor dúvida é o renascimento do paraíso, com a espiritualidade cristã e a materialidade socialista sendo representativos hoje de Eva e Adão respectivamente. É mesmo o momento em que é dito na Palavra de Deus: Eis que a tenda de Deus está com a humanidade, e ele residirá com eles e eles serão os seus povos. E o próprio Deus estará com eles. E enxugará dos seus olhos toda lágrima, e não haverá mais morte, nem haverá mais pranto, nem clamor, nem dor. As coisas anteriores já passaram (Apocalipse 21.3). Como diz o profeta Isaías, não serão mais lembradas e não subirão mais ao coração (Isaías 65.17);




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