segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Lúcio - III


Lúcio Junior Espírito Santo. Tenho feito uma análise entre essa questão da volta da Teologia ao fundamento, da sua volta a Cristo, e tenho visto que ela se acha em conflito com o seu trabalho profético e missionário. Quer dizer, até onde pude entender essa volta ao fundamento é literalmente apartar, afastar a Teologia do Marxismo. É os cristãos criarem um caminho próprio completamente desligado do Marxismo deixando-o se debatendo sozinho sobre seu futuro. Ou, numa hipótese otimista, se for permitido que a Teologia prossiga com seus laços com o Marxismo já será numa visão bem diferente, em que a Teologia é a essência e o Marxismo, acidente. O Marxismo passaria a ser cauda e perderia a condição de cabeça. E, todavia, naquilo que pude ler dos seus escritos, tenho observado que você trabalha numa direção completamente oposta, ligar o Marxismo à Teologia numa forma ainda mais radicalizada do que feito pela Teologia da Libertação.

Adamir Gerson. Certamente e devo dizer que estou fazendo este trabalho já como sendo fiel à Palavra de Deus. Veja bem, encontramos no livro do profeta Isaías, capítulo 65, o vaticinio sobre o aparecimento futuro na cena da história de uma nação completamente paradoxal: esta nação não iria invocar o nome de Deus, não iria dobrar seu joelho diante de Deus, todavia seria esta nação quem faria a vontade de Deus. Não é nação de Israel com seus reis e com seus sacerdotes, mas seria uma nação estranha que por razões desconhecidas não teria ao menos formalmente ligação com a Palavra de Deus. Mais tarde encontramos agora Jesus repetindo o mesmo juízo e vaticínio de Isaías sobre esta nação paradoxal. Ele dirige-se aos sacerdotes dos seus dias e lhes diz que o reino de Deus lhes será tirado e dado a uma nação que produza os seus frutos – ver Mateus 21.43.
Quem é esta nação que aparece nos escritos proféticos de Isaías e de Jesus? Com toda a certeza trata-se da nação socialista. Lançando mão do silogismo de Aristóteles o resultado só pode ser a nação socialista.
Acontece, porém, que Isaías, depois de vaticinar o aparecimento futuro desta nação, trará um segundo momento agora apresentando Deus tirando o véu que o separa desta nação e se dando a conhecer a ela. Vejamos: E certamente vereis, e vosso coração forçosamente exultará, e os vossos próprios ossos florescerão como a tenra relva. E a mão de Javé há de ser dada a conhecer aos seus servos, mas ele verberará realmente os seus inimigos, Isaías 66.14.
Não só Isaías, mas também Jesus. Depois de no verso 43 do capítulo 21, livro de Mateus, encontrar-se Jesus se dirigindo aos sacerdotes dos seus dias e lhes dizendo que o reino de Deus lhes seria tirado e dado a uma não que produziria seus frutos, no capítulo 25 verso 40 deste mesmo livro de Mateus encontramos Jesus dialogando com este povo e procurando esclarecê-los sobre a sua natureza e missão divinos.

Lúcio Junior Espírito Santo. O que tenho, então, deduzido é que enquanto muitos sacerdotes estão trabalhando para afastar da Teologia o Marxismo, talvez com a pretensão de dizer, em nome de Cristo: Afastai-vos de mim, vós os que tendes sido amaldiçoados, para o fogo eterno, preparado para o Diabo e seus anjos, o vosso trabalho reserva um futuro diferente para os marxistas.

Adamir Gerson. Perfeitamente. Apesar de que muitos estão com a certeza que vão se dirigir aos marxistas para pronunciar sobre eles esta maldição constante no texto de Mateus, na verdade eles vão, por aquele que tem o direito legal, ouvir coisa diferente. Ou seja: vinde, vós os que tendes sido abençoados por meu Pai, herdai o reino preparado por vós desde a fundação do mundo. Pois fiquei com fome e vós me deste algo para comer; fiquei com sede, e vós me deste algo para beber. Eu era estranho, e vós me recebestes hospitaleiramente; estava nu, e vós me vestistes. Fiquei doente, e vós cuidastes de mim. Eu estava na prisão, e vós me visitastes

Lúcio Junior Espírito Santo. Alguém já disse com muita razão que se espantava de que os acontecimentos narrados na Bíblia são uma recorrência ao longo de toda a História. Estão sempre se repetindo, e às vezes em situações completamente diferentes. No caso que estamos tratando, esse futuro que aguarda o povo marxista, não se está diante de uma situação idêntica àquela vivida pelo judeu Mordecai? Afinal o príncipe Hamã, com trânsito ao rei, tramou a morte do judeu Mordecai unicamente por maldade porque Mordecai não se curvou diante dele. Mas Mordecai não estava sozinho. Na corte do rei Assuero ali tinha alguém especial com ligação umbilical a Mordecai, a rainha Ester. Resumindo, a história deu uma reviravolta e o madeiro que o príncipe Hamã erigiu para enforcar o judeu Mordecai o rei ordenou que Hamã fosse enforcado nele. Estes homens que estão se reunindo e produzindo documentos com a clara intenção de afastar a Teologia de qualquer contato com o Marxismo não podem estar possuído pelo espírito do príncipe Hamã?

Adamir Gerson. Realmente a história envolvendo Mordecai, a rainha Ester e o malfadado príncipe Hamã é uma história interessante e bonita. E mais ainda porque sabemos que foi um fato real. Certamente que estamos diante de uma história muito bonita, recompensadora e, mais do que isto, que trás reflexão para nossos dias. As reviravoltas que o caso foi tendo, com Hamã então vestindo Mordecai das vestes reais, colocando-o no cavalo do rei e andando com ele pela praça pública clamando diante dele: assim se faz ao homem em cuja honra o rei se agradou, deve mesmo servir de reflexão para todos nós. Os marxistas podem até ser este Mordecai do livro de Ester, contudo não cabe nenhuma dedução de que estes sacerdotes envolvidos com o caso de frei Clodovis Boff e empolgados com a sua coragem e mea-culpa sejam o Hamã da história. Estão reunidos e até decidindo pela expulsão do Marxismo do universo teológico, mas embasados em algum fato concreto. De que é indevida a ligação da Teologia com o Marxismo. Certamente que não há consenso entre eles sobre uma decisão final. Muitos estão reconhecendo que realmente há incompatibilidade de muitos aspectos do Marxismo com a Teologia e com o cristianismo. E estes, no entanto, estão dizendo que é preciso olhar os grãos. O que significa dizer que eles reconhecem no Marxismo algo de fundamental com pertença à Teologia e que estes grãos não podem simplesmente ser descartados, mas recolhidos ao celeiro da construção do Reino. São tijolos que ajudarão na construção do seu edifício. Como são homens que se reúnem iluminados pela luz do Espírito Santo, certamente que chegarão a um consenso que o Marxismo devidamente filtrado pode sim atuar numa frente com os cristãos para a construção de um mundo melhor e mais feliz. Mesmo porque nem mesmo entre os marxistas os seus pressupostos fundantes seja consenso. Isto é, quando olhado em totalidade.

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