Zapatismo. No início do ano de 94 um grupo guerrilheiro ocupou diversas repartições públicas no estado pobre de Chiapas, México. Porque os guerrilheiros não tinham o objetivo de lutar contra o sistema senão que o de exigir melhorias para a população pobre do país, em especial os índios de Chiapas, e porque depois daquele episódio único pareceu que eles “depuseram as armas”, a verdade é que, mormente comunicado romântico e de humor, e o seu líder Subcomandante Marcos escondendo a sua identidade é a sua subscrição, o movimento zapatista tem adquirido conotação negativa entre as forças de esquerda. Sendo apenas visto como um grupo político reformista, sem projeto de transformação, sem intenções de aprofundar as contradições no interior da sociedade mexicana e levá-la a confrontos revolucionários com o poder estabelecido.
Isto é verdadeiro? Do ponto de vista positivista, que vê o aparente, o que se manifesta à retina, isto é verdadeiro. Mas o movimento zapatista deva ser visto com outros olhos, pelo viés filosófico.
Na verdade o movimento zapatista foi o resultado do Espírito em movimento de retorno a si mesmo. Na sua transformação de um extremo ao outro, do extremo da Lei para a Graça, do extremo da Ditadura do Proletariado para o extremo da Democracia de Jesus. Nesta cadeia, o movimento zapatista no México já foi o segundo momento, tendo sido o sandinista o seu primeiro momento, e o que está prestes a se manifestar no Brasil o seu terceiro momento.
Do que estou falando? Ora, tivemos na América não ianque a revolução cubana. E ela fez reviver as revoluções da velha Europa. Literalmente a russa. Foi leninista na tomada do poder, foi plekhanovista na introdução da NEP, e por fim foi stalinista. A revolução cubana seguiu este mesmo ideário da revolução russa.
Mas, a revolução russa trazia no seu ventre uma negação, que haveria de construir a igualdade no ventre da liberdade, de modo que nela liberdade e igualdade, que tanto na revolução russa como na francesa estiveram de costas, apartadas, em puro antagonismo, nesta nova revolução estariam juntos. Se relacionando, mutuamente se ajudando, de modo que a sua igualdade iria ser uma nova Igualdade, porque construída no ventre da liberdade, e a sua liberdade iria ser uma nova Liberdade, porque construída no ventre da igualdade. E como esta nova revolução iria ser construída no continente latino-americano, eis a revolução cubana, o reviver neste lado do mundo, da revolução russa.
Então veio o seu segundo momento, a revolução sandinista, que foi leninista, teve o momento da NEP russa, mas não foi stalinista. E como o stalinismo é corpo inseparável do leninismo, o leninismo se completa no stalinismo, e sem esta complementação a revolução se esvanece, se encaminhava para morrer na NEP que só não se deu porque salva pelo stalinismo, e onde não teve a complementação do stalinismo morreu, o caso da revolução portuguesa, mas também o caso da revolução sandinista.
Ora, se o Espírito estava em processo de transformação, indo de um extremo a outro extremo, tanto do extremo geográfico, da eurásia para a América Latina, como do extremo ideológico, da Ditadura do Proletariado para a Democracia de Jesus, e se na revolução sandinista já produzira uma nova figura de espírito, não só a revolução foi feita com a presença maciça dos cristãos como não foi stalinista, foi leninista, mas não stalinista, a verdade é que com os zapatistas o Espírito dá um novo salto de qualidade: vai deixar de ser também leninista! E certamente que na sua consumação, a se dar no país Brasil, não só não leninista e não só não stalinista, mas, pela primeira vez, na revolução, então o rosto de Jesus aparece no lugar do rosto de Marx. Uma nova autoridade!
Então o movimento zapatista deva ser visto com olhar metafísico e não mais positivista. O movimento zapatista não se trata de apenas um movimento reformista, interessado apenas em melhoria para o povo no interior do sistema, sem maiores implicações que estas. O movimento zapatista deva ser visto como o momento em que na revolução se dá a completa negação do leninismo. Uma nova tomada de consciência revolucionária, o momento mesmo em que o Espírito sai à sua procura.
Destarte, o leninismo, uma vanguarda revolucionária, que toma sobre si a responsabilidade da revolução, com a sua capacidade intelectual e a sua força suprindo toda a falta e fraqueza do proletariado, é isto que agora será contestado em benefício de uma nova práxis. Não se trata mais de uma vanguarda fazer a revolução em nome do povo e governar em nome do povo, mas, sim, do povo fazer a revolução e não mais ter governantes como seus representantes senão que eles mesmos são seus representantes. Não se trata mais de repetir uma prática que a experiência demonstrou que será catastrófica ao final. O edifício do socialismo foi construído sobre seu alicerce. Mas se sabe que pela qualidade do material empregado na construção da obra, e aí diz respeito ao seu embasamento teórico, quando no interior da obra se revelar novas necessidades será então que começarão a aparecer rachaduras. Certamente no edifício, mas também no alicerce, porque o material do conjunto da obra é o mesmo. De rachadura em rachadura chega um momento em que todo o edifício implode (não faltando aqueles que sairão a reunir seus cacos pensando com os cacos reconstruir toda a obra).
Pois é, é esta a visão do zapatismo, construir o socialismo na via tradicional do lenininismo, como muitos grupos estão empenhados, é ter a certeza de que o tempo revelará que todo esforço foi em vão. Tudo terá de novamente ser repetido, é um ciclo, se buscando Bode Expiatório – que não é o Bode – para legitimar o recomeço de tudo, como fazem estes grupos que querem construir o socialismo pela via tradicional do leninismo, que eles dizem única, justificando a sua luta para reconstruir o que ruiu apontando com o dedo indicador ora para Stálin, ora para Trotsky, mas nem um único se virando para Marx e dizendo, com o dedo indicador na posição de riste: FOI VOCÊ! Construímos a casa do socialismo conforme as medidas que você nos deu, e veio o vento dos descontentes e ele não suportou o peso do seu sapateado.
Então foi dito que o movimento zapatista está construindo o socialismo por novas armas, por via própria? Não, mas foi dito que ele representa o momento da tomada de consciência por parte da revolução que é preciso um novo existir revolucionário. A experiência amarga e que deixou marcas profundas forçou o Espírito a nova imaginação revolucionária. Detectou um ciclo a que está sujeito, e se pôs a contorná-lo, buscando alternativa. O movimento zapatista não pode construir o socialismo por esta via porque implica todo um trabalho para que os odres velhos sejam transformados em odres novos; e aí sim então deixar neles o vinho novo do socialismo. Um trabalho assim é missão do socialismo celestial, e tudo está preparado no país Brasil para que um trabalho assim aconteça. Dessa forma, do começo de tudo em Cuba, passando pela Nicaraguá sandinista e subindo ao estado Chiapas do sul do México, então tudo está preparado para a sua consumação no Brasil, berço deste novo existir revolucionário.
Que se manifesta já trazendo em si a marca do zapatismo. Só um exemplo, se os trabalhadores têm a capacidade de abrir estrada e construir sobre ela o asfalto, não tem também condições de gerenciar as praças de pedágio? E as praças de pedágio revertem o fluxo do dinheiro para os próprios usuários, pois são empregados ao longo da rodovia em benefício de todos, na construção de oficinas, postos de atendimento médico, e etc. E praça de pedágio agregada à praça de pedágio o resultado é a formação de uma única praça de pedágio, nas mãos dos trabalhadores, que, dessa forma, estão usufruindo plenamente do trabalho de suas próprias mãos, como vaticinou o profeta Isaías. O que vale para a praça de pedágio, como exemplo, vale para tudo na sociedade. E é esta a essência do zapatismo, não aguardar o fim do capitalismo ou trabalhar o seu fim para então construir a nova sociedade, mas construir a nova sociedade no seu interior, como quem constrói a casa nova dentro da casa velha, expulsando seus cômodos velhos até que a casa nova se tornou única.
E temos já à nossa frente uma preparação, estes milhões de rostos de brasileiros sem nome a se esconder atrás de uma máscara social, mas que de uma forma ou outra passaram a conhecer o poder do evangelho em suas vidas. Foram transformados espiritualmente ou ao menos ficaram sabendo que o Evangelho tem o poder de transformar os indivíduos; fazer com que abandonem os vícios, o desamor familiar, a futilidade, e assim sendo, disponibilizados como odres novos aptos a receber o vinho novo das boas Novas. O novo socialismo nasce das entranhas do Evangelho, ou nasce dele ou não nasce de modo algum. E é preciso que ele primeiro chegue aonde se forma e desenvolve a sua força intelectual, e estamos falando dos muitos centros de estudos teológicos espalhados Brasil afora. E destes às grandes massas que já foram transformadas espiritualmente e destas às grandes massas que ainda não experimentaram em suas vidas o poder que o Evangelho tem para fazer delas novas criaturas.
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